12 dic 2013

[África do Sul]: a “Marca Mandela” marcha a todo o vapor

Colamos do blogue do "Colectivo Libertário de Évora":

(Nota do Colectivo Libertário de Évora: Este artigo foi originalmente publicado no site anarco-comunista sul-africano zabalaza.net, a 6 de Junho de 2013, seis meses antes da morte de Nelson Mandela e refere-se à mitificaçom e aproveitamento da figura deste resistente e combatente de longa data contra o regime de apartheid sul-africano. Com a sua morte esta mitificaçom e aproveitamento tomaram dimensons enormes. Nom há hoje ninguém, da esquerda à direita, do capitalismo mais abjecto ao marxismo mais fora de moda, que nom elogie Nelson Mandela e a sua luta. Este artigo assinado por Tina Sizovuka, que integra o Tokologo African Anarchist Collective, aproxima-nos do olhar dos anarquistas sul-africanos face a Nelson Mandela, mas sobretudo aos aproveitamentos políticos e comerciais que dele têm sido feitos, mesmo antes da sua morte).

Nelson Mandela converteu-se numha marca: a “Marca Mandela”. A sua imagem, nome, biografia e outros dados conexos som utilizados para gerar lucros e promover a lenda do personagem. Em Julho de 2012, por exemplo, foi lançada no mercado a linha de roupa 46664 (o seu número de prisioneiro nas prisons do apartheid); claro “made in China”.

Mas a “Marca Mandela” é algo mais do que umha oportunidade para vender bugigangas estúpidas a turistas e celebridades. Também é um mito perigoso, um culto promovido diariamente na imaginaçom do público e que está ao serviço de interesses muito mais sinistros. O mito de Mandela é utilizado para dar, por associaçom, credibilidade à viciosa classe dominante sul-africana e para legitimar o partido dominante Congresso Nacional Africano (ANC). Nom é de estranhar que o lançamento em 2012 dos novos “randelas” – umha nova série de notas da África do Sul, com a imagem de Mandela – coincidiu com a conferência nacional do ANC em Mangaung.

E este “dinheiro Madiba” (Madiba é o nome popular de Nelson Mandela) chegou juntamente com umha série de outros dispositivos de glorificaçom a Mandela. Estes incluem a apresentaçom em Bloemfontein, onde o ANC foi fundado em 1912, de umha nova estátua de Mandela. Segundo o Presidente do país e actual chefe do ANC Jacob Zuma, trata-se de um símbolo “da reconciliaçom e a da tolerância”, e umha forma de recordar que devemos “continuar a falar” sobre o herói nacional e a sua “verdadeira história”

O facto de criticarmos a “Marca Mandela” de maneira nengumha sinifica que menosprezemos os sacrifícios pessoais que Mandela fez durante a luta contra o apartheid, o seu papel que foi visível na transiçom de 1994, quando se conseguiram avanços significativos nos direitos coletivos. Mas suscitar a emoçom popular com a iconografia da libertaçom e com o uso da imagem de Mandela como se fosse a de um santo vivo, foi umha forma de ocultar a história muito menos heróica do ANC no poder e as realidades desagradáveis da conferência de Mangaung.

Tal como qualquer outra propaganda nacionalista a “Marca Mandela” tem sido usada pelos ricos e poderosos para perpetuarem um sistema de classes putrefacto, um sistema que o ANC ajuda a manter através das suas políticas neo-liberais, as suas ofertas de “empoderamento” para as novas elites e os massacres policiais. Um sistema que tem causado a miséria para os milhons de pobres sul-africanos a quem se diz que teriam sido “libertados” por Mandela.

Na África do Sul este sistema de classes está dirigido por umha aliança de capitalistas privados (na sua maioria brancos) e administradores estatais (na sua maioria negros) que actuam em conivência, dado os seus interesses de classe serem comuns. Depois de umha história sangrenta que assegurou a existência de muito pouco espaço para as aspiraçons de outros no sector privado dominado pelos brancos, o Estado converteu-se no principal meio para que a elite negra alcançasse dinheiro e poder.

É por esta razom que o ANC, como guardiám do acesso aos recursos do Estado, converteu-se num espaço tam disputado. O caminho para Manguang esteve marcado nom pela “reconciliaçom e a tolerância”, nem por “continuar a falar sobre o herói”, mas sim pela rivalidade entre facçons corruptas, acusaçons de fraude eleitoral e inclusivamente pela tomada de reféns e pelo assassinato... Isto é o ANC na realidade, pese embora os esforços desesperados levados a cabo pela facçom dominante de Zuma tentando promover um alegado sonho nacionalista herdeiro da “magia de Madiba”.

E, por último, para deixar as coisas claras, Mandela nom foi o autor heróico e individual da libertaçom do país. Mesmo se teve um papel importante, o próprio nunca se proclamou indispensável para esse processo. A quem, fundamentalmente, devemos agradecer os avanços conseguidos em 1994 é à maioria trabalhadora negra e aos seus aliados de todas as raças, aos seus esforços coletivos e à solidariedade que fortaleceu as suas lutas.

Se Jacob Zuma quer umha “história verdadeira”, ela aqui está.

(traduçom do CLE a partir da versom espanhola do "Periódico El Libertario")

Mais informaçom sobre a atualidade na África do Sul:

África do Sul está na hora da classe trabalhadora e dos pobres despertarem (artigo do 09/12, 4 dias apos a morte de Mandela, assinado por Lucien van der Walt, Tokologo African Anarchist Collective, traduzido ao português pelo CLE)

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